A CIDADE (RE) CRIADA PELA INFÂNCIA
Nayana Brettas Nascimento
O cenário urbano tem seus espaços e equipamentos pensados “pelo” e “para” os adultos, de forma a atender às suas necessidades, não havendo uma cidade pensada a partir das mediações entre crianças e adultos com a integração e valorização das idéias, sugestões, necessidades, desejos e propostas da infância.
Estamos diante de uma cidade pensada, projetada e construída por adultos e para adultos, que “adota como parâmetro o cidadão adulto, abandonando os cidadãos não adultos” (Tonucci, 1997, p.181). As tomadas de decisões relativas à organização dos espaços públicos estão cercadas de barreiras relacionadas à linguagem tecnocrática e com estilos de negociação que diluem a infância na ordem social dos adultos não valorizando o seu conhecimento urbano.
Lima (1989) critica esta pretensão dos adultos, arquitetos, planejadores urbanos e políticos de acharem que podem construir espaços voltados para os interesses e desejos que não são os seus sem consultarem e escutarem o que a criança tem a dizer.
Temos como exemplo, as escolas e os parques infantis, espaços para as crianças na cidade, pensados a partir do imaginário e da concepção dos adultos, sem levar em conta as idéias daqueles que mais utilizam tal espaço – as crianças.
Na medida em que a infância tem lugar central nas discussões das ciências médicas, das políticas públicas e educacionais, ela tem a sua presença, ação e participação na cidade invisibilizada. Daí a importância de problematizar e refletir sobre a exclusão urbana da infância.
A invisibilização da infância nos espaços públicos da cidade revela quais são seus lugares sociais na cena urbana. Os espaços do brincar com os parques infantis, e os espaços educativos com as escolas, constroem uma cartografia urbana da infância.
A delimitação de lugares específicos para as crianças na cidade “denuncia” uma situação de exclusão urbana da infância, já que não é vista como ator social pertencente e com direito à cidade.
A infância participa e é inserida no espaço público pela via escolarizada onde a forma escolar representa uma nova maneira de conceber a aprendizagem que rompe com os processos de continuidade do meio social.
As expressões corriqueiras “lugar de criança é na escola” ou “a rua não é lugar de criança” revelam quais são os lugares da infância na cidade e que tipo de relação devem estabelecer com ela.
As escolas regulam o tempo urbano da infância, determinando quanto tempo irá “sobrar” para entrarem em contato e se relacionarem com a cidade. Os horários de entrada e saída das escolas, ditados pelos toques das sirenes, controlam os processos de enchimento e esvaziamento de crianças pelas ruas que, diariamente, transitam pelos espaços citadinos trajadas com seus uniformes escolares e mochilas nas costas.
A relação das crianças com a cidade é observada nos intervalos de tempo em que transitam de casa para a escola e da escola para casa. Observamos que elas brincam de acordo com as próprias necessidades, mediante uma leitura metafórica e um uso lúdico dos espaços e equipamentos urbanos. Segundo Sarmento (2004), as crianças vão transitando em um espaço intersticial entre o que é concedido pelos adultos e o que é reinventado no seu mundo de vida através do imaginário e da cultura lúdica.
As apropriações lúdicas da cidade pelas crianças são exemplos de (re)criações da cidade. Assim, elas vão participando da cidade graças a inúmeras possibilidades de construí-la e reconstruí-la, ao se permitir "olhar o mundo através das infinitas recomposições que a imaginação nos permite" (Castro, 2004, p. 215).
O meio de locomoção utilizado pela criança para realizar seus percursos diários influencia na forma de ver, apreender, utilizar, ocupar e se relacionar com a cidade. Utilizar meios de transportes motorizados é ver uma cidade passante que passa velozmente diante dos olhos infantis. A utilização dos transportes públicos, para além de ver a cidade veloz, as crianças têm a possibilidade de entrar em contato e se relacionar com uma diversidade de pessoas desconhecidas, que renovam diariamente a paisagem humana de trens, metrôs, ônibus.
Aquelas crianças que caminham à pé até a escola têm a oportunidade de ter um contato mais direto com a cidade, podendo parar, voltar atrás, ver e rever o mesmo elemento urbano identificado e observado, descobrir e (re) descobrir, (re) criar e (re) construir espaços e equipamentos urbanos.
Durante a semana, as crianças estão na escola e, aos finais de semana, podemos vê-las nos parques infantis a brincar nos tradicionais brinquedos dos playgrounds.
Mesmo que as possibilidades de contato das crianças com a cidade sejam reduzidas e efêmeras, elas encontram suas formas próprias de apropriação, (re) criações e relações identitárias com o espaço urbano, em seus intervalos de tempo de transição entre casa-escola e escola-casa, e em suas brincadeiras nos parques infantis.
Assim, as crianças de presenças velozes na cidade (re) criam o cenário urbano com suas formas próprias de expressão, manifestação e ação.
A relação das crianças com a cidade possibilita a aquisição de conhecimentos urbanos e sociais que desvendam a complexidade citadina. Estar e viver a cidade e seus acontecimentos diários é aprender e apreender seus códigos e signos, é realizar descobertas, é conhecer sobre as relações sociais construída entre as pessoas, é aprender a se locomover pelo espaço, é conhecer a cidade em que mora.
Ter as crianças circulando e ocupando os espaços públicos da cidade contribui para o resgate das relações entre as pessoas. A espontaneidade das crianças em conversar com aqueles que encontram pelas ruas sem mesmo conhecê-los fazem pernas aceleradas pararem, bocas conversarem e olhares se cruzarem, e fazem sorrisos serem esboçados em faces sérias e sisudas.
Para compreender a importância da presença das crianças na cidade é preciso ver a cidade como um espaço educador com possibilidades de aprendizagens formais e informais. Todo e qualquer lugar, espaço ou elemento urbano é potencialmente cultural, histórico e educativo. Uma esquina, uma rua, uma praça pode possibilitar aprendizagens tão ricas quanto museus, livros e conhecimentos adquiridos na escola.
Aprendemos e ensinamos o tempo todo, em todos os lugares e na relação com as pessoas. A cidade não se explica, ela só é sabida ao ser explorada e praticada pela experiência e vivência.
A realidade social está dada - a expansão e aumento do tempo de permanência de crianças de 0 a 6 anos de idade - dentro das instituições escolares, devido a inserção cada vez maior das mulheres no mercado de trabalho. Com os pais tendo que trabalhar e não podendo diminuir a sua carga horária porque esta implica em redução do salário, é preciso de um local –escola – com profissionais para ficar com estas crianças.
É importante pensar em uma rede de integração entre a escola e a cidade, através de uma proposta pedagógica que extrapole os muros escolares para utilizar o meio urbano e social como agentes educativos. Afinal, a escola não é a única via de aprendizagem e, sim uma entre muitas possibilidades de adquirir conhecimento.
A escola integrada com os espaços públicos – ruas, parques, praças, museus – promove a participação urbana infantil. Esta rede de integração sustenta-se em quatro pilares promovidos pela escola: conhecimento, ocupação, intervenção e participação nos espaços e equipamentos urbanos pelas crianças.
O primeiro passo é possibilitar às crianças passeios urbanos para que conheçam os espaços e equipamentos urbanos de sua cidade. Na medida em que realizam estes passeios elas vão ocupando os espaços urbanos dando visibilidade a sua presença na cidade.
A partir do momento em que as crianças conhecem a cidade elas começam a fazer intervenções nos espaços e equipamentos urbanos participando da (re)criação da cidade.
A dimensão relacional da escola não pode ser

18/08/2009

 


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